é natal

Por Tomás Vasques
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É Natal, mas um Natal sem esperança para a maioria dos portugueses, como já não havia há dezenas de anos. Um Natal que faz lembrar outros tempos, em que o ditador de Santa Comba Dão elogiava as virtudes da malfadada pobreza em que se vivia; em que centenas de senhoras, com nomes a cheirar a perfume caro, como Jonet e outros, de fina e esmerada educação, tocadoras de piano nos salões onde habitavam, aliviavam a triste sina dos “pobrezinhos” com caridosas esmolas dadas à porta das missas, onde iam lavar as almas e remover os pecados; em que milhares de portugueses sem trabalho deixavam o país e a família, carregando às costas todas as desventuras de um povo dentro de uma mala de cartão. Há de novo, nestes tempos que correm, o elogio da pobreza, o incentivo à emigração, o louvor da caridade, enquanto se acusa a maioria dos portugueses de todos os males do mundo: os salários que recebem são muito elevados para aquilo que produzem; o valor das reformas está acima do que descontaram; as indemnizações por despedimento são um roubo que destrói a economia; o subsídio de desemprego só alimenta ociosos ou que não pagam impostos suficientes para ter luxos como saúde e educação quase à borla. Só não é Natal como antigamente porque nos falta o burrinho e a vaquinha no presépio, adornos do nosso imaginário, que Sua Santidade nos roubou. Roubam-nos tudo, nem o burrinho e a vaquinha do presépio escaparam ao saque.

A propósito do Natal e de saques, os povos maias anunciaram, há muitas centenas de anos, o fim das nossas vidas para este Natal. Segundo a leitura dos entendidos, por alturas do solstício de Inverno, precisamente deste Inverno de 2012, quando a estrela Régulo entrasse no sexto sector do zodíaco tropical, onde está o signo de Virgem, o “mundo acabava”. Assim, sem mais nem menos. Não acabou porque os astros também se enganam. Para mal dos nossos pecados, não eram só os povos maias a ler nos astros o nosso futuro. Agora os nossos governantes também se guiam por estrelas e conjugações astrais. No Natal do ano passado, quando apresentaram o Orçamento do Estado para este ano, prometeram a redenção em troca de pesados sacrifícios. Mas nada bateu certo: a receita do Estado caiu, a despesa aumentou, o défice e a dívida externa ficaram acima do que foi prometido. Talvez a entrada da estrela Oríon em Capricórnio, no zodíaco sideral, não tenha ajudado as contas de Vítor Gaspar. E se os povos maias não acertaram no dia do fim do mundo, o nosso ministro das Finanças não lhes fica atrás: não acerta uma previsão.

Neste Natal do nosso descontentamento, no Orçamento do Estado do próximo ano, os nossos governantes duplicaram a dose da receita que ampliou a desgraça, provavelmente acreditando que a estrela Riguel, da galáxia de Andrómeda, entrará em Vénus em meados de 2013. A decisão do Tribunal Constitucional, lá para Abril, sobre alguns dos saques a que o Presidente da República se esquivou a pedir a avaliação da constitucionalidade e a opinião da Comissão Europeia de que a redução de 4 mil milhões de euros na despesa do Estado não chega para as encomendas feitas por Berlim, vão marcar a dimensão do desastre que este governo anda a engendrar. É pois de temer o momento em que Vítor Gaspar e Passos Coelho se sentem à mesa na noite da consoada e, desiludidos com os astros, passem ao candomblé angolano, chamando o deus Inkices, e lancem os búzios. Sairá seguramente aumento da carga fiscal, redução de salários, pobreza e miséria, se entretanto o governo não cair com o estrondo que merece.

Neste Natal de 2012, sem burrinho, nem vaquinha no presépio, e com a desgraça a bater à porta de quase todos os portugueses, em vez do menino Jesus do que menos precisávamos era de ter o nosso destino nas mãos de bruxos e adivinhos.

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