e agora, mutti?

Por Viriato Soromenho-Marques

A expressão da vitória eleitoral de A. Merkel confirma um raro laço de confiança entre um povo e uma dirigente, traduzido na ternura da sua alcunha, "Mutti" (mãezinha). Merkel tem agora uma responsabilidade imensa, ampliada pelo eco deixado pelo vazio de ideias e de carácter reinante nas outras capitais europeias.

Na chancelaria do Spree, e sobre os ombros de uma mulher, vai recair muito da possibilidade de a Europa se refundar, ou, pelo contrário, se envilecer no rancor, no empobrecimento, na resignação, e, finalmente, na dilaceração. O prognóstico é reservado, mas a química da solidão do poder oferece surpresas, e nem todas desagradáveis. Para que a esperança regresse ao coração dos europeus é preciso uma alteração profunda das regras do jogo.

O chanceler Schröder foi o primeiro a encarar a Zona Euro como um espaço de competição a todo o custo. Violou as regras do PEC e submeteu os alemães a uma austeridade brutal para fazer crescer os excedentes comerciais de Berlim. Com isso aumentaram ainda mais as assimetrias na balança de pagamentos dos Estados da Zona Euro, agravadas pela crise bancária. A universalização da austeridade não só não resolveu, como agravou estes problemas. Merkel terá de escolher. Ou um novo jogo, baseado nas regras da soma positiva, em que todos ganham, permitindo à periferia retomar o fôlego. Isso implicará avançar na união fiscal e orçamental (e não só na disciplina), na coordenação económica, e na atribuição ao BCE da missão de apoiar o desenvolvimento. Esse jogo garantirá, em contrapartida, o florescimento da economia alemã. Ou continuar o actual jogo de soma nula, em que todos perdem e só a Alemanha ganha. Com isso, Merkel daria a Berlim mais algumas vitórias, que, paradoxalmente, acelerariam o desmembramento europeu.

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